bullying


1- O que é bullying? Quais suas características?
"Bullying é uma palavra inglesa (bully, que significa ‘valentão’, ‘brigão’) que não possui uma tradução adequada para o português. Alguns a traduzem como ‘provocação’, ‘intimidação’, ‘assédio’ ou ‘vitimização’, mas esses termos reduzem um pouco a situação, pois não compreendem toda a complexidade do problema. 

O bullying é um problema que ocorre entre crianças e adolescentes no Brasil e no mundo. Acontece com maior frequência na escola, na relação da criança com seus colegas. Porém, também pode ocorrer em outros ambientes, como na vizinhança, em centros esportivos e em outros locais que sejam frequentados por crianças e adolescentes.

Trata-se de uma série de comportamentos agressivos repetitivos que acontecem em um contexto de desequilíbrio de poder entre o agressor e a vítima. Essas agressões podem ser físicas, verbais ou relacionais e têm objetivo de prejudicar outra pessoa."
 


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)


2 - Que atitudes podem ser consideradas bullying e quais não podem ser encaradas como tal? 
"O limite entre o que é bullying e o que é uma brincadeira é muito tênue. O mais importante é reconhecer se o comportamento causa sofrimento para a vítima e se o agressor o pratica com a clara intenção machucar, prejudicar ou causar sofrimento. 

O bullying não é sinônimo nem de violência nem de agressão. O que se pode dizer, é que toda situação de bullying é agressiva, mas nem toda a agressão pode ser caracterizada por bullying. Para ser bullying a agressão tem que ter um caráter intencional, precisa acontecer repetidas vezes e o agressor deve possuir certo ‘poder’ sobre a vítima, que se sente impotente frente à situação de vitimização e não sabe se defender. 
É importante lembrar que o fato de uma única agressão não se caracterizar como bullying não significa que ela não seja grave. Uma agressão isolada, ou distinta do bullying, pode causar, também, sérios prejuízos físicos e psicológicos."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 

3 - O bullying sempre foi um problema ou se tornou uma preocupação recentemente?
"O bullying sempre existiu, mas antes não tinha esse nome e nem era tão discutido na sociedade. Quem deu o grande pontapé nos estudos sobre este tema foi o pesquisador Dan Olweus, na Noruega, na década de 1970. Ele estava preocupado com o número de suicídios de crianças e adolescentes na Europa, que tinha como uma das principais causas os maus-tratos por parte de colegas de escola. 

É possível que hoje os casos de bullying sejam mais frequentes, afinal, vivemos em uma sociedade mais intolerante, mais competitiva e mais individualista, em que a violência é banalizada e está presente nas relações pessoais presenciais e virtuais e nos meios de comunicação." 


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

"Todo diálogo entre pais e filhos é importante e ajuda na prevenção do problema, mesmo se a criança não estiver envolvida, diretamente, em situações de bullying. Até porque, a criança poderá se deparar com as mais diversas situações de violência ao longo da sua vida escolar. 

Discutir com a criança sobre o certo e o errado, sobre a importância da amizade, do respeito às diferenças e de tratar todas as pessoas com educação, certamente trará importantes benefícios. Nos tempos atuais, mais do que nunca, estas características vêm sendo extremamente valorizadas, seja nas escolas, seja no contexto adulto. Cada vez mais as empresas, por exemplo, vêm buscando profissionais mais ‘humanizados’, que saibam trabalhar em equipe, valorizar e respeitar a diversidade."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

"Essa pergunta me remete a outra pergunta: Se você sofrer algum tipo de violência, dia a dia, ao longo de muitos meses, isso vai tornar você mais forte ou uma pessoa melhor? Provavelmente não, né? Então porque achar que o bullying poderia trazer algum tipo de benefício para a criança? 

O fato de algumas crianças lidarem melhor com o problema do que outras não significa que o bullying deva ser banalizado. Estudos têm mostrado que a opinião dos adultos sobre o bullying é controversa. Há pais que banalizam o problema, dizendo, por exemplo, que o bullying ajuda a criança a se tornar forte. Por outro lado, há pais que adotam uma postura hipervigilante, preocupando-se em demasia, achando que tudo é bullying. Por isso, o importante é prestar atenção e participar ativamente da vida da criança, para identificar qualquer possível problema e prepará-la para as adversidades e conquistas que ocorrerão ao longo da vida."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 

6 - Como identificar se meu filho está sofrendo bullying - no caso de ele não me contar?
"Não há critérios precisos sobre como identificar a ocorrência de bullying, mas alguns sinais são comuns nas crianças vítimas, como por exemplo: 

- Dificuldade de aprendizagem e de concentração em sala de aula; 
- Queda repentina no rendimento escolar; 
- Resistência para ir à escola, falta de interesse nas atividades escolares (sobretudo aquelas que envolvem maior interação, como passeios, gincanas e outras atividades extraclasse); 
- Pesadelos, insônia ou medo de dormir sozinho; 
- Choro frequente, queixas em relação à escola; 
- Sentimento de exclusão perante os colegas; 
- Relatos de estar sofrendo deboches ou humilhações; 
- Pedir pra abandonar ou trocar de escola; 
- Tornar-se agressivo, ansioso ou deprimido; 
- Voltar pra casa com machucados, roupas e materiais danificados, entre outros.

É importante deixar claro que esses sinais não significam que a criança, necessariamente, esteja sofrendo bullying, mas é importante estar atento a eles."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

7 -  Como ensinar meu filho a se proteger e se defender caso receba agressões dos colegas?
"Em casos de vitimização, é importante orientar a criança a buscar ajuda de um adulto (professor ou pais), a não guardar segredo sobre a situação e a evitar contato com o agressor. 

Entre 2008 e 2012 realizei um estudo sobre os comportamentos agressivos de crianças no contexto escolar. O estudo contou com mais de 700 crianças de Porto Alegre e região metropolitana. Verificou-se que os meninos tendem a serem mais agressivos que as meninas e a atitude de pedir ajuda ao professor em casos de vitimização foi mais comum em meninas do que em meninos. Os meninos tendem a revidar a agressão com mais frequência que as meninas, que tendem a reagir chorando e se isolando. Esses resultados estão relacionados a questões culturais sobre o comportamento esperado para meninos e meninas na nossa sociedade. Muitas vezes meninos são rechaçados pelo próprio grupo se pedem a ajuda de um adulto."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

8 - Revidar é uma opção para se proteger do bullying?
"Nesses casos, provavelmente, revidar não é a resposta mais efetiva, se o objetivo é evitar novas agressões. Revidar as agressões com novas agressões aumenta o ciclo de violência no contexto em que as agressões ocorrem (por exemplo, no pátio da escola). 

Além disso, é comum que a criança vitima possa se tornar vítima-agressora, ou seja, passar a agredir outros colegas. Por exemplo, é comum a criança sofrer bullying de uma criança mais velha ou mais forte e ‘descontar’ sua frustração, agredindo crianças mais jovens ou mais frágeis física ou psicologicamente. Neste sentido, é importante a intervenção da escola na tentativa de cessar a cadeia de agressões, adotando uma política pedagógica que atinja todas as séries e envolva as diferentes áreas e os diferentes profissionais."


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 

9 - O que eu posso falar para o meu filho que sofre bullying e como ajudar a melhorar sua autoestima?
"Criar e educar filhos não é uma tarefa fácil e não existe uma receita mágica sobre a melhor forma de fazê-lo. De todo modo, algumas estratégias podem ser efetivas para o desenvolvimento emocional saudável da crianças. Dentre elas, cito: 

- Reforce as potencialidades e as características positivas da criança. 
- Elogie se ela for merecedora e aponte os erros, quando necessário. 
- Seja um exemplo para sua criança. De nada adianta punir a criança por comportamentos que são comumente adotados por outros membros da família. Lembre-se que os principais e primeiros modelos de referência da criança são os pais ou os cuidadores principais. 
- Permita que a comunicação flua, sem repreensão ou julgamentos desmedidos.
- Ensine os valores de amizade, tolerância, respeito. Isso valerá não só para o presente, mas para toda a vida dos seus filhos. 
- Explique à criança as regras básicas de comportamento com clareza e com linguagem apropriada à sua idade. 
- O ‘não’ pelo ‘não’ fica sem sentido, mas um ‘não’ bem explicado e justificado pode fazer toda a diferença. 
- Incentive o seu filho a ter amizades, ensinando-o a diferenciar as relações saudáveis daquelas que o prejudicam. 
- Supervisione o comportamento do seu filho, mas não sufoque, nem seja intrusivo. É importante que seu filho sinta que não está só, mas também é importante que não se sinta sufocado. 
- Procure passar mais tempo com seus filhos, desenvolva atividades juntos, cultive hábitos prazerosos (jogos, brincadeiras, conversas), ajude-os a descobrir e desenvolver seus talentos. 
- Informe-se e informe seu filho. Converse sobre o tema do bullying, explique sobre suas consequências. 
- Participe mais ativamente da escola do seu filho, pergunte como foi seu dia, sobre o que brincou, como foi a hora do recreio e como foi passar o dia com seus colegas. 
- Se seu filho possui alguma característica física que o diferencie dos seus colegas, tente não supervaloriza-la. Converse com ele sobre a importância das diferenças e de que, em alguma medida, ninguém é igual a ninguém. Se ele souber aceitar a si próprio, será mais fácil ser aceito pelo grupo."

Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

"O diálogo entre pais e escola é sempre importante. Estudos vêm mostrando que a ação conjunta que envolva a família, a escola e a comunidade como um todo tende a ser mais efetiva do que qualquer outra intervenção. Por outro lado, as escolas ainda não estão preparadas para lidar com o bullying. Os professores, por exemplo, sentem-se impotentes, pois de uma hora pra outra, passaram a ser cobrados para intervir diante do bullying cometido/sofrido por seus alunos. Ao mesmo tempo, sentem dificuldade de identificar e agir, muitas vezes, por não terem um treinamento adequado ou por estarem sobrecarregados com tanta demanda de trabalho ou por não possuírem o apoio da escola ou dos pais. 

Quanto à postura dos pais, especificamente, o diálogo é o mais importante. Conversar com a criança, entender como ela se sente diante da vitimização e quais são as suas expectativas em relação à postura dos pais diante do problema. É essencial que ela sinta que não está sozinha e que tem com quem contar. Muitas vezes, a agressão física é percebida como mais grave do que a agressão verbal. Mas colocar apelidos pejorativos pode machucar tanto quanto. A agressão relacional também é comum e prejudicial. É caracterizada pela exclusão do grupo ou por fofocas e difamações. Muitas vezes ela inicia na escola, mas continua do lado de fora, por meio de computadores e redes sociais (cyberbullying), o que torna mais difícil a identificação por parte da família e da escola." 


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

11 - Qual é a melhor maneira de a escola lidar com o bullying?
"A escola deve intervir, sobretudo, pensando na prevenção e não na punição. Ela pode desenvolver, por exemplo, atividades curriculares e extracurriculares que visem a promover práticas pró-sociais. Na sala de aula, na educação física e em atividades de grupo podem ser trabalhados temas como amizade, cooperação, empatia, espírito de equipe, respeito às diferenças. 

Também é essencial que a escola estabeleça um bom canal de comunicação com os pais. O diálogo e a criação de políticas que envolvam pais e escola permitem que as ações sejam mais sólidas e consistentes, e não medidas isoladas e sem força. 

É importante deixar claro, também, que se a escola não tomar providências efetivas para cessar uma situação de bullying, os pais podem recorrer ao Judiciário, solicitando indenização por danos morais e ressarcimento de possíveis despesas com psicoterapia ou medicamentos, por exemplo. Do mesmo modo, os pais podem ser responsabilizados pelos atos de agressão praticados pelos filhos. Já existem, inclusive, decisões nesse sentido. A própria escola pode informar aos pais das crianças agressoras que, em caso de omissão dos mesmos, ela poderá encaminhar o caso ao Conselho Tutelar e, em casos extremos, diretamente, ao Ministério Público ou ao Judiciário. Tanto o professor quanto a escola (e todos os seus funcionários) devem intervir perante uma situação de bullying, sob as penas da lei, conforme Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)." 


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

12 - Se a criança não quer voltar para a escola: devo concordar ou propor que ela tente se reconciliar com a outra criança?
"Mudar de escola pode resolver o problema em um primeiro momento, mas não necessariamente a longo prazo. Pode afastar a vítima do agressor ou o agressor da vítima, mas se a criança não adquirir recursos pra se defender poderá se tornar vítima na nova escola. Do mesmo modo, se a criança costuma agredir seus colegas, é provável que ela encontre novas vítimas potenciais na nova escola. Então, essa decisão de mudar de escola não deve ser a primeira atitude a ser tomada. Antes disso, é importante conversar com a criança sobre a real necessidade e motivação para mudar ou não de escola. É fundamental, também, buscar estratégias de enfrentamento e resolução do problema junto à escola do seu filho. É importante lembrar que trocar de escola afasta a criança vítima do seu agressor, mas também de seus amigos e professores com quem possui uma relação positiva." 

Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

13 - Qual é o caminho para superar o bullying, mesmo anos depois da violência? Como os pais podem ajudar nesse processo?
"O bullying pode trazer importantes prejuízos tanto para a vítima como para o agressor, podendo atingir também as crianças que assistem aos episódios de agressão, mas que não participam ativamente. Ansiedade, depressão, episódios de pânico, dificuldade de se relacionar com outras pessoas, problemas de rendimento acadêmico, abuso de substâncias, envolvimento em atos infracionais são alguns exemplos de problemas tanto a curto prazo como ao longo de toda a vida. Por isso, é importante estar atento aos sinais que a criança emite. Em caso de sofrimento é muito importante que os pais busquem ajuda profissional especializada. Um psicólogo qualificado será capaz de auxiliar a criança a superar dificuldades e buscar recursos internos para lidar com o problema e com suas consequências." 

Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)


Juliane Callegaro Borsa, doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)


14 - Biblioteca de apoio
São recomendados aos pais três livros, que são de fácil compreensão e trazem dicas superlegais sobre como intervir em situações de bullying. Muitas das dúvidas aqui trazidas são discutidas nestas obras, que possuem linguagem acessível e conteúdo útil, tanto para os pais como, também, para os educadores: 


- Bullying Escolar: perguntas e respostas, de Cleo Fante e José Augusto Pedra. Editora Artmed;




- Proteja seu filho do bullying, de Allan L. Beane. Editora Best Seller;




- Manual Antibullying, para alunos pais e professores, de Gustavo Teixeira

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